sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Choro na Soleira da Porta




Choro na soleira da porta.
Não sei porque choro,
ou talvez saiba,
talvez julgue saber.


Choro defronte da porta.
Não sei porque choro.
Passa uma rapariga, para mim olha
e me vê a chorar, mas passa,
passa sem me beijar, falar...


Choro atrás da porta.
Não sei porque choro.
Passa um homem, nem repara em mim,
ou não quis e passa,
passa sem me cumprimentar...


Choro olhando a porta, escorregam-me as lágrimas.
Não sei porque choro.
Passa um rapaz, não me fala,
não me fala e vai-se embora...


Choro encostado à porta, escorrego com a dor, atroz...
Não sei porque choro.
Passa uma mulher, no jardim,
ela é bonita, mas não me liga
e passa sem me acariciar...


Não sei porque choro,
ou talvez saiba, 
talvez julgue saber...
choro porque pintei mal a porta,
esborratei, estraguei a porta...


Mas é pouco para eu chorar,
mas então: - Porque choro?
Porque todos os transeuntes conhecia, com eles falo,
mas nenhum dos passantes me dirigiu a palavra.


Choro, de tudo choro.
Choro, porque de tudo choro.




Julho de 1993
SAC

sábado, 5 de novembro de 2011

O Tempo Passa




O tempo passa,
o café arrefece
mas só se esquece
do tempo quem passa
atrás do tempo...


São aqueles
a quem o tempo ficou
o café arrefeceu
se esqueceu deles,
daqueles...


a quem o tempo
se tornou
custoso, pesaroso
por causa dos outros.
Forçoso, doloroso
por culpa dos outros.
Desespero, exaspero.
Por prazer dos outros
estou entre a espada e a parede.


A espada de bronze afiada.
A parede de rede.
A rede envolta em cimento
... dum prédio que ali estava.


Voltei à realidade
e... lá estava:


A faca da manteiga
apontada, afiada a mim,
por trás de mim;
por trás a parede do café, meiga...


Mais meiga que a espada.
E empurro a parede.
Nunca a espada afinada.
Empurro a parede.


O tempo passa (o esforço)
O café arrefece (mimoso)
Mas só se esquece
do tempo quem passa
atrás do tempo.


Novembro de 1994
SAC