sábado, 27 de fevereiro de 2010

A Rosa dos Santos


Apontavam para mim os teus seios.
Dançavam falando teus lábios
tão quentes e... tão cheios
que apertavam os meus olhos de desejo.

Saltavam teus seios tão fartos
quando entravas onde eu estava
e entrava contigo eu onde estavas tu,
que já Deus não importava,
que já sorte não precisava,
que já Sol queria não nascesse.

Voavam teus cabelos soltos,
Dançava teu corpo nu com roupas,
enquanto bebia frutos que pendiam de ti
e lançava meus olhos aflitos
e dormia em momentos finitos
e passava por eles sem passar.

Bebia teus lábios bonitos
e enquanto os bebia
perdia-me em ti
e perguntava:
porque te chamas imaginação?

Terça-feira, 16 de Maio de 1997
SAC

A Atitude Divina


Não era santa não,
pois que a sua bondade
era mais que milagre.

Não era profetisa não,
que a tal não ascendia
pela sua real humildade.

Não era a divindade em nome,
mas que à direita de Deus Pai
está, não tenho dúvidas.

E quem as tenha
deve ocupar a esquerda de belzebu,
lugar das mil súplicas,
das não atendidas almas,
as dos profetas da desgraça,
da vendeta e dos critérios.

Mas por mais mistérios,
por mais irados
e mais histéricos que sejam...

Não passarão
de idades, fases quentes e não pensadas

Não passarão
de momentos efémeros, injúrias inchadas.

E passarão
de ouvido a ouvido,
sem o coração ouvir, indiferente,
sem a cabeça sentir, descontente,
sem que a bílis se não torça, se não tente...

Ah Vovó...
Que saudades tenho eu de Ti.

Nada mais tenho que dizer...
Vou tentar seguir-Te.

Terça-feira, 16 de Janeiro de 1996
SAC

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Dança Poliritmada


Certas vezes incertas
a vida assemelha-se
a um transporte público.
Mal que bastasse já era
a vida assemelhar-se a coisa alguma…

Certo dia incerto embarcas sem crer
no relógio descompassado que mede
algo que perdeste.

Por uma vez chegas a tempo
na rotina do cansaço
a tempo do tempo e do espaço
e do próximo comboio.

Aceito os apertos, os empurrões,
os cheiros pestilentos
dos sovacos malcheirosos,
dos hálitos apodrecidos
e dos pés mal lavados.

Aceito a violência gratuita,
de borla, sempre fajuta,
das facadas e dos assaltos
mão-armada ou pé descalço.

Aceito os idiotas dos anões
tão parvos que discutem, violentos,
virulentos assuntos tão pequenos,
tão mesquinhos, tão cheios de nada.

Aceito a minha condição pobre,
coitado, atirado, arremessado,
arrevesado de um para outro lado
ao sabor dos carris,
à medida de uma tosse de Inverno,
à sombra de um sol morto.

Aceito o descompasso,
o desencontro,
o desalinho, o desacordo,
a dança poli ritmada
de uma vida só com algum sentido:
o sentido do minuto…
que no minuto seguinte
já nada vale,
tudo desmente, desmonta e desfaz,
sujeito ao virar de uma esquina
inesperada,
ao virar de um beijo
roubado,
à curva do comboio de hoje
perdido.
Estou.
Lá.
E não me encontro.

Afinal o comboio, outro,
Vive dentro de mim.
E não sabia.

Quarta-feira, 6 de Setembro de 2006
S. João da Talha

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Saco de Sol


Serão maviosas as tuas mãos que recordo.
Nessa esperança adormeço.
E dormente acrescento mais uma noite
às noites onde o meu coração dorme ao relento.

Serão ciosas as tuas mãos que relembro.
Nessa magia acredito. Só nessa magia.

Porque na bola de cristal
só vejo e revejo uma lanterna de Aladino
que não posso esfregar.
E em vez dos desejos por realizar
três crucifixos vazios vejo
onde nenhum mártir se ousou deitar.

Nenhum messias,
nenhum druida,
nenhum oráculo,
nenhum Natal te traria de volta
hoje, agora, de imediato, já...

E enquanto isso, por isso, antes disso,
durante, somente, até e por causa disso
levanto-me todas as manhãs
antes do nascer do sol.

Aqui em Lisboa
todos os dias são escuros.

Porque tenho o raiar do Sol
guardado num saco
para to dar.
Quando voltares.

Quinta-feira, 8 de Dezembro de 2005
Montijo

sábado, 6 de fevereiro de 2010

A Musa Perdida


Dei-te um beijo, soubeste-me a morango.
Dei-te outro, soubeste-me a mulher.
Outro ainda e subias as escadas do Olimpo.
Dei-te um abraço e fiz uma fogueira...

feita dos meus ossos
por não te merecer,
feita dos teus também
pois sabia que renascerias...

nas cinzas que mastigo
todos os dias, todas as noites,
todos os dias de castigo,
todas as noites no postigo...

em que vivo, consciente
sem ti, para ti e por ti,
em que morro, paciente
sem ti, de ti e por ti.

Segunda-feira, 18 de Dezembro de 1995
SAC