segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Chove...

Chove...
E eu estou só...
Chove...
E sinto-me acompanhado...

Apenas por mim,
pela minha infância,
minha inocência,
velhos tempos...

Velhos tempos estes,
em que me lembro
de outros tempos,
outras vontades...

Lembro-me de mim.
De mim e mais alguém.
Lembro-me do deserto.
De mim e do deserto.

Nada tenho, apenas areia.
Nada vejo, apenas o céu.

Quarta-feira, 12 de Maio de 1993
SAC

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Buscando Algo em Alguém


Levando na palma da mão uma vida sozinha...
Trazendo na ponta do pé uma alma vazia...
Deixando na beira do rio um olhar tão meu...

Um olhar que só pararia se olhasse o mar.
Um olhar que só morreria se parasse no fundo
e se esse fundo fosses tu
e se este mundo fossemos nós,
morreria com prazer o meu olhar,
morreria com prazer ao teu passar,
morreria se a morte fosse doce,
morreria se a morte fosse... o que eu procuro.

Mas não é.
Morto já estou eu.
Quem leva sozinho uma vida sozinha...
Quem traz no corpo vazio uma alma vazia...
não pode estar outra coisa senão morto.

Mas sou eu. Sou eu e não o meu olhar
que fui deixado, à beira do rio,
à beira do nada,
no meio do tudo,
desamparado,
procurando o mar,
dentro de alguém.

Sábado, 17 de Janeiro de 1998
SAC

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Borbulhando num Café


Desta vez tenho tempo
para escrever o que me apetecer.
Desta vez até tenho tempo
para esquecer o que te apetecer,
para dominar a minha tristeza,
para dormitar na tua solidão.

Desta vez tenho até espaço
para te dar um abraço,
apertar-te e cingir-te num laço,
Lua que és de mim pedaço
diz-me: o que é que eu faço?

Finge. Continua a fingir
que és tu e mais ninguém.
Salta. Continua a saltar
mais alto que o mundo dos outros.
Corre. Continua a correr
do comboio do azar.
Corre. Não te deixes apanhar.

Mas dá. Dá de ti tudo,
tudo aquilo de que não,
de que não precisas por ser,
por ser demasiado pesado.
E finge. Continua a fingir
que és tu, que és tu e mais ninguém.

Quinta-feira, 2 de Outubro de 1997
Santos - Lisboa