sexta-feira, 12 de março de 2010

As Cordas que me Prendem Tenho Medo de As Não Tecer


As cordas que me prendem tenho medo de as não tecer
pois são, não passado inóspito mas inóspito futuro,
próximo como a guilhotina, como as noites e os dias
de cemitérios arrepiantes e loucuras frias,
de Norte desnorteado e desabaladamente obscuro,
de ter medo de morrer, de ter medo de viver.

Tenho medo de morrer, como tenho medo de viver,
mas as cordas... as cordas que vou tecer
não passam, por não passar que passam, de um fio obscuro
que não diz nada do meu passado, de amor e futuro,
que não diz nada de suores, preocupações e mãos frias,
que nada diz de choro e dos passados dias.

Ontem nada tinha, apenas dois dias
em que me diverti a ver morrer de viver
as minhas ossadas em catadupas frias,
sem que de lã, de linho ou água quente as pudesse tecer.
Ontem nada tinha, apenas a minha imagem no espelho do futuro,
pálida, olheirenta, sonolenta, negra, suja e triste, como o céu de mar invernoso, obscuro.

Mas apesar de ser obscuro, não sou, não penso e não ajo obscuro.
Sou eu, sou claro, sou digno e os meus dias
nada têm a ver com os dias dos outros e de futuro
vou ser o presente, vou ser eu e viver
sem pena ser poeta sem musa tecer
com sentimento palavras que nada têm de frias.

Apareceu um pintor de mãos frias.
Apareceu um príncipe de cavalo branco e obscuro
e que faz todo o ano mil almofadas tecer.
Apareceu um homem que rema para os dois lados, todos os dias,
sem parar, sem cansar, sem, viver
vou, pensando no presente ir vivendo o meu futuro.

E depois? Eternamente o meu presente vai ser o meu futuro.
Mãos. Porque tenho que as ter se o pintor as tem frias?
Por um sábio que te soube saber viver
não, não te vou ser obscuro.
Apenas, apenas viver todos, todos os dias
e enquanto o futuro for uma mancha só, vou só tecer...

Que interessa a mim pensar, tecer e parecer o futuro?
E os dias da morte que nascem sempre em tardes frias?
Obscuro vou ficar, escondido quero estar, no presente viver.


Terça-feira, 9 de Janeiro de 1996
SAC

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